Malu: uma liderança negra em três entidades da Enfermagem

No mês da Consciência Negra, o Sindicato dos Enfermeiros(as) do RS já trouxe a visão de três dos cinco vereadores negros eleitos na capital.

Para fechar o mês de novembro, entrevistamos a enfermeira Maria Lúcia Pereira de Oliveira, que atua no HCPA, onde preside a Associação dos Enfermeiros(as). Malu, como é conhecida entre os colegas, faz parte da diretoria do SERGS na pasta de Gênero, Raça e Diversidade Sexual, e agora também integra a chapa vitoriosa no Coren-RS. Veja as ideias de Malu sobre a profissão e a participação dos negros na sociedade e na enfermagem.

SERGS – Como você avalia sua participação na próxima gestão do Coren-RS?
MALU – É com sentido de responsabilidade que assumo compor o grupo de conselheiras e conselheiros eleitos do COREN- RS, Gestão 2021 – 2023. A atual gestão se destacou pela transparência na realização de seus projetos, dialogando com a categoria, valorizando a educação e formação dos profissionais de enfermagem. Contribuir na continuidade destas ações apresenta-se como um grande desafio. Ao mesmo tempo, me sinto muito motivada em fazer parte de um grupo unido que demonstra competência e comprometimento na representação da categoria.

SERGS – Qual a importância da sua participação no SERGS, AEHCPA e agora no Coren-RS?
MALU – A importância da minha participação nas entidades de classe, está na compreensão de que são essas entidades, as responsáveis pela representação social dos profissionais, contribuindo de forma expressiva para valorização da profissão e dos profissionais de enfermagem. Sou sindicalizada há 28 anos desde o inicio da minha vida profissional, e tive oportunidade de compor o grupo de diretores do SERGS como Diretora para assunto de gênero e raça. Da AEHCPA participo como sócia desde quando comecei a trabalhar no HCPA, e em 2017 concomitante com minha participação no SERGS, fui conduzida ao cargo de Presidente da Associação pelo voto de meus colegas. 2017 foi um ano histórico, caracterizado pelo desmonte de políticas públicas e sociais e de derrocada de direitos que nos pareciam consolidados e garantidos, como a Reforma Trabalhista e em seguida a Reforma da Previdência. Foi um período de muito trabalho e muito aprendizado com minhas colegas de gestão. A AEHCPA é originada de uma instituição pública maior, com reconhecida função social e foi preciso trabalhar intensamente não perdendo de vista sua função estratégica nos processos de garantia do que já estava regulamentado na profissão e na defesa de direitos de enfermeiras e enfermeiros como trabalhadoras e trabalhadores. Como conselheira eleita do Coren levo minhas experiência e aprendizados que foram resultado dos períodos de convivência, vivências e muitas lutas. Ouso dizer que fizemos história, participando de marchas e caminhadas pela garantia de direto de trabalhadores e trabalhadoras da enfermagem. Passamos por um período de precarização do trabalho da enfermagem que nos fragiliza e nos expõe profissionalmente. É papel do conselho, a garantia do exercício legal da profissão através de estratégias de qualificação profissional e discussões sobre aspectos éticos , preservando e priorizando a prestação de serviços de qualidade para toda a população. As atividades da Enfermagem são realizadas durante 24 horas, dia após dia, sem nunca serem interrompidas, denotando a dimensão da complexidade e a responsabilidade que envolvemos neste trabalho.

SERGS – Como você avalia a participação de uma mulher negra e ativista nestas entidades?
MALU – Considerando que a enfermagem é uma categoria profissional formada por 84,6% de mulheres e 53% dessas mulheres, são mulheres negras, nos deparamos com a origem da enfermagem e com a história de luta e resistência das mulheres negras, necessário se faz ocupar espaços de representação social. Quando a enfermagem moderna se institucionaliza no final do século XX, foi negado às mulheres negras o direito a profissionalização. Por conta da Eugenia, ciência amplamente difundido sobre a superioridade da raça branca, mulheres negras foram excluídas desse processo. O Brasil foi o último país da América Latina a abolir o tráfico e escravização de negros e negras. Vivemos sobre forte influência política, social e cultural do Brasil colônia, onde homens e mulheres escravizados eram treinados por religiosos no exercício da obediência e abnegação em casas de saúde. Estar no Coren, atuando em parceria com minhas colegas enfermeiras no grupo de trabalho Racismo e Enfermagem é fundamental na compreensão do racismo estrutural , propondo ações que contribuam na desconstrução desse modelo.

SERGS – Que recado você gostaria de deixar nesta Semana da Consciência Negra?
MALU – Ainda precisamos falar muito na data 20 de novembro. Como nos fala o Jurista e filósofo Brasileiro contemporâneo Dr. Silvio Almeida ,” racismo está ligado intrinsicamente com elementos que estruturam a vida social , como a economia , o direito , a política e também a produção do imaginário social que coloca o povo negro no espaço produzido para sua ocupação , que é na situação de vulnerabilidade “. Em tempos de Pandemia COVID 19 em que negros e negras estão morrendo por encontrarem -se em situação de maior vulnerabilidade social como vítimas de um sistema de saúde de saúde que não tem condições de lidar com a demanda provocada pela doença, profissionais da enfermagem negros e não negros precisam estar organizados e unidos em suas entidades de classe na defesa do SUS. A equipe de enfermagem, em geral, é o primeiro profissional de saúde com que os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) têm contato quando procuram uma unidade de atendimento , recentemente declarada pela OMS como a espinha dorsal do SUS. O Sistema Único de Saúde, é o maior empregador dos profissionais da enfermagem, é quem está dando conta de não haver número maior de mortos na maior crise sanitária nos últimos 100 anos. Sem o SUS, certamente haveria um número muito maior de mortos. Ser antirracista é defender e fortalecer o SUS.

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