DIU: um dispositivo na arena de lutas

Um dispositivo pode ser pensado como um conjunto de mecanismos institucionais e estruturas de conhecimento que aprimoram e mantêm o exercício do poder dentro do corpo social, constituindo sujeitos e os organizando. O corpo social pode ser comparado a um conjunto de arenas de lutas pela verdade.

A ARENA DE LUTAS na qual a Enfermagem se debruça neste momento é a da inserção do DIU de cobre por enfermeiras, uma realidade que em países como Inglaterra, Escandinávia, EUA, Argentina e Chile, reverte na excelência da atenção em saúde.

A inserção de DIU por enfermeiras foi questionada por corporações médicas adversas às evidências científicas e às recomendações internacionais. Este questionamento pretendeu, mais uma vez, interferir diretamente sobre o exercício profissional da Enfermagem, o que pode ser considerado uma prática descabida ética e juridicamente. a inserção do DIU por médicos e enfermeiras tem se constituído em arena de lutas onde a categoria médica pensa que deve sobrepor-se a da Enfermagem, desqualificando-a.

Este embate se deu a partir do momento em que o Ministério da Saúde do Brasil emitiu a Nota Técnica 5/2018-CGSMU/DAPES/SAS/MS em que enfermeiras e médicos são descritos como profissionais com competência técnica e legal para inserção do DIU. Esta medida visava ampliar a oferta de contracepção imediatamente após os partos e às usuárias em serviços de atenção primária à saúde.  No entanto, esta Nota Técnica foi revogada em dezembro de 2019.  A imprensa brasileira noticiou a revogação, destacando que o governo cedeu às pressões do Conselho Federal de Medicina que, coincidentemente, apoiou a candidatura do atual governo.

É nesta ARENA DE LUTAS que a colega Maíra Libertad, enfermeira obstétrica, entra com ação junto ao Ministério Público Federal de São Paulo. Esta ação, alinhada aos movimentos nacionais da Enfermagem como Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras, COFEN e CORENs, Sindicatos da Enfermagem e a manifestação pública de associações médicas como a Rede Feminista de Ginecologistas e Obstetras e Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, garantiu que no dia 22/01/2020 a Defensoria Pública da União e Defensoria Regional de Direitos Humanos recomendassem ao Ministério da Saúde a reversão da revogação da Nota Técnica no prazo de 15 dias a contar em 22/01/2020 ratificando a importância da enfermagem na inserção do DIU. Mais, o Ministério Público Federal reafirmou a necessidade brasileira de implementar mais ações voltadas ao planejamento familiar destacando que, com a restrição do acesso feminino a este tipo de planejamento, o Brasil estaria contrariando Objetivos do Desenvolvimento Sustentável do qual é signatário.

É lastimável a disputa que pretendeu confrontar profissionais que deveriam se unir em defesa SUS e em torno da garantia às mulheres brasileiras a uma saúde digna, humanizada e segura. Neste confronto ficou visível o pensamento de posse e desprestígio do corpo feminino e da necessidade de desqualificar a Enfermagem em suas competências de forma a garantir a hegemonia da corporação!

Quem perderia? O corpo social que deste modo teria seus direitos sexuais e reprodutivos ainda mais restritos.

Profª Drª Virginia Leismann Moretto – Professora Associada da Escola de Enfermagem da UFRGS, presidente da ABENFO-RS e membro da Câmara Técnica do Coren-RS

Profª Drª Mariene Jaeger Riffel – Professora Associada da Escola de Enfermagem da UFRGS,  vice-presidente da ABENFO-RS e membro da Câmara Técnica do Coren-RS

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